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o resto que posso ser é um ser que não resta

por Ramon Carlos
Joaquin Torres Garcia (1933)

Haicão

Dormindo num cinzeiro
Nadando sem meia
E ardendo feito o diabo
Fazia azia
Com brasa no conhaque
E desfilava
Como um bode na coleira

Ai de mim pequena!
O céu afrouxou
Feito um nó de forca
Meia-entrada
Meia, meia, meia
Culpa


Haicão II

Uivando numa grota
Voando sem pelo
E caindo feito um arranjo
Indo rindo
Com piadas na coleira
Ar de anjo
Enterrando borboletas no útero

Ai de mim pequena!
O acordo acordou
A corda, a corda, acorda
Viu meu nó vil?
Viu meu nó,
Viu?!


Haicão III

Gorjeando submerso na lava
Emergindo numa cápsula transcendental
E pairando em ponto morto
Passando assando
Com brasas no distintivo
Maquiabéblico
Entranhas para metamorfoses em tranhas

Ai de mim pequena!
A ribalta pegou fogo
E não posso correr
Sem antes
Queimar
Meu figurino


Anestésico

Após descobrir
Que os mosquitos têm dentes
Todas as noites,
Quando esses bastardos decidem aparecer
Eu tenho uma certeza, meu bem
De tanto sugarem você
Agora eles precisam de mim
Do meu sangue alcoólico
Para aliviarem suas dores
E é só por isso
Que não os mato
Apenas mastigo
Um que outro
Para velar
Seu sabor


Ramon Carlos é coautor do livro estrAbismo (Editora Viseu, 2018). Escreve no site: www.estrAbismo.net. Tem materiais diversos espalhados em revistas
como: Mallarmargens, Aboio, LiteraturaBr, Acrobata, Philos, Amaité Poesias &
Cia, InComunidade, LiteraLivre, Subversa, Ruído Manifesto, Literatura &
Fechadura, Jornal Plástico Bolha, A Bacana e Cidadão Cultura.

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